Sobre Bossa Nova

Na década de 50, um grupo de jovens que moravam no Rio de Janeiro, em busca de uma nova música que fosse mais próxima ao contexto no qual viviam, permeado pelo mar, pela praia e pelas belezas cariocas, começaram a se reunir no apartamento de Nara Leão, em Copacabana. Esse grupo, agregados pelos mesmos gostos e tendências, era formado por Roberto Menescal, Carlos Lyra, Ronaldo Bôscoli, Oscar Castro, entre outros. Assim, essa turma que estava aprendendo a tocar violão, instrumento que depois se tornou símbolo da Bossa Nova, foi experimentando novas possibilidades, batidas e sonoridades.

Nesse tempo, morar em Copacabana era um desejo de muitos, o que fez com que as construções nesse bairro fossem se tornando cada vez menores, com apartamentos pequenos e suas paredes finas. Desse modo, não se podia fazer muito barulho na sala de Nara, já que, se isso acontecesse, os vizinhos poderiam reclamar. Assim, eles se acostumaram a tocar e cantar baixinho, em um tom quase falado, o que se tornou característica primária do estilo. Foi então que, a partir dessas reuniões, a música feita por esse grupo começou a tomar forma, surgindo as primeiras composições, os primeiros shows e uma rápida identificação daquela geração com essa batida diferente, influenciada, de maneira determinante, pelo jazz norte-americano, mas também pelo samba nacional.

Em 1958, quando foram fazer uma apresentação no Grupo Universitário Hebraico do Brasil (uma associação estudantil no Flamengo), alguém cuja identidade não se conhece, escreveu no cartaz “Sylvinha Telles e o Grupo Bossa Nova”. A partir de então, eles batizaram a música que faziam como Bossa Nova. Alguns meses depois desse evento, Tom Jobim e Newton Mendonça compuseram “Desafinado”, com o verso “isto é bossa nova, isto é muito natural”, consolidando de vez o nome.

Menescal afirma que, na época, cada um, inclusive ele, tinha a sua batida de violão e todas elas eram diferentes, aí veio João Gilberto e todos eles tentaram se aproximar da batida dele.  Portanto, foi João Gilberto que chegou e definiu tudo aquilo que estavam fazendo, no álbum Chega de Saudade, lançado em 1959, marco definitivo para que os músicos profissionais da época dessem espaço para esse novo gênero, aparecendo, a partir desse, outras gravações. Esse compacto de 78 rotações, com arranjos e direção musical de Tom Jobim, tinha apenas duas faixas, mas que foram suficientes para revolucionar a nossa música. De repente, o que era feito de maneira despretensiosa, tomou um grande proporção e sucesso, ganhando cada vez mais destaque na música brasileira e também mundial.

O respeito com o qual os músicos e compositores brasileiros começaram a ser tratados no exterior ficou incontestável e a prova desse sucesso foi a Bossa Nova sair das noites cariocas para os holofotes internacionais. No dia 21 de novembro de 1962, alguns dos representantes da Bossa Nova subiram ao palco do Carnegie Hall, em Nova York e, ao contrário do que muitos disseram, o show foi um grandioso sucesso e a sala de espetáculo estava lotada. Depois dessa estreia em solo internacional, eles foram contratados para tocar no Auditorium of Washington e no Village Gate, em Nova York, este último considerado a pátria do jazz. Com essa primeira apresentação, os rumos da Bossa Nova foram mudados para sempre, pois, nesse período, a música brasileira ficou em primeiro lugar nas paradas de sucesso norte-americanas, mostrando-se para o resto do mundo, por meio dos principais jornais, revistas rádios e canais de televisão.

Certamente, aqueles jovens não imaginavam que aquela música que estavam fazendo seria algo tão significativo e importante para a música brasileira, bem como tão duradoura. A música Garota de Ipanema, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, por exemplo, tornou-se a segunda mais executada na história mundial, estando atrás apenas de Yesterday, dos Beatles. E mesmo depois de 60 anos de história, completados em 2018, a Bossa Nova continua atuante e cruzando oceanos, sendo ainda a música brasileira mais difundida no cenário internacional.

E esse sucesso chegou de uma forma definitiva no Japão, em março de 1964, com o lançamento do LP Getz/Gilberto, cuja ficha técnica é composta por João Gilberto, na voz e violão;  pelo americano Stan Getz, no sax tenor; por Tom Jobim, no piano; e ainda Astrud Gilberto, também no vocal. De  acordo com Menescal, de todos os produtos que o Brasil exporta para a terra do sol nascente, a música brasileira ainda é a mais consumida. A sofisticação da harmonia bossa novista e a sua sonoridade suave combinam diretamente com a forma cognitiva e emocional dos japoneses, conquistando-os e sendo referência musical para eles até hoje. Um evento importante a ser destacado no Japão, aconteceu em 1997, em comemoração aos 40 anos da Bossa Nova, quando cerca de 10 mil japoneses cantaram junto com Wanda Sá, Roberto Menescal, Carlos Lyra, Ivan Lins, Joyce, Leila Pinheiro, entre outros, num show ao ar livre em Tóquio, denominado “Gets Bossa Nova”.

São poucas as pessoas no mundo que, em algum momento da vida, não tenham escutado alguma música de bossa nova, ou não tenham entrado em contato com esse gênero. E, mesmo que, atualmente, esse não esteja no topo das listas de músicas mais tocadas no Brasil, continua sendo o nosso cartão postal musical e uma das principais marcas da nossa identidade. A bossa nova sempre está presente na televisão, no cinema, nas propagandas, nas festas, e por que não dizermos, nas salas de espera e nas lojas de conveniência. Sou uma cantora e compositora brasileira, já tive a grande honra de ser parceira de Menescal durante dois anos, e um dos meus maiores orgulhos da vida foi entrar em várias kombinis, no Japão e escutar a nossa bossa nova, bem como sentir de perto o amor e o carinho que os japoneses têm pela nossa música e por nós, brasileiros.

Andrea Amorim